Imagina você entrar numa sala cheia de móveis e objetos. Eles estão empilhados uns por cima dos outros, sem nenhuma organização. Você não sabe para onde olhar, sente um incômodo, mas sem entender exatamente o que lhe causa desconforto. Sem hesitar, tenho a certeza de que é o excesso o grande causador dessa sensação incômoda.
Isso também acontece na hora de escrever um livro. Talvez essa lógica acumuladora de colocar tudo dentro de um livro venha dessa mentalidade capitalista de querer mais e mais. Sempre mais. Mas quando se trata de literatura, eu não tenho dúvidas: menos é mais.
A literatura precisa de espaço para o não dito, para aquilo que está nas entrelinhas, para a interpretação do leitor. Sempre imaginei o leitor como um co-autor, aquele que participa ativamente do livro. Por essa razão, talvez mais importante do que acrescentar algo em um texto literário seja retirar algo dele.
Há uma história de um artista famoso que dizia que seu trabalho artístico consistia em tirar daquela escultura tudo o que não era seu projeto, ou seja, todos os excessos. Desde que ouvi essa história, me dei conta de que nossa missão como escritores é tirar do livro tudo o que não é o livro.
Desde personagens que estão sobrando, figurantes que não acrescentam nada para a narrativa até orações intercaladas, palavras e firulas desnecessárias.
Certa vez assisti a uma entrevista com uma editora que dizia que o maior erro de escritores iniciantes com o seu original é a ansiedade. Querer dizer tudo no primeiro capítulo. Colocar muitos elementos, informações, personagens e temas que não serão possíveis de desenvolver ao longo do livro. Facilmente se percebe que não há clareza, nem para quem lê nem para quem escreve, a respeito daquele texto e de sua construção.
Recentemente, uma leitora me perguntou se eu tinha escrito rápido A filha primitiva, romance vencedor do 6° Prêmio Kindle de Literatura. Ela me disse que ele é um livro curto, muito fluido e veloz. Respondi que não. Contei que tinha escrito o romance ao longo de quatro anos e que o livro teve 11 versões e passou por 4 leituras críticas. Ela ficou impressionada. Certamente esperava outra resposta.
Talvez esperasse ouvir que escrevi o livro num fluxo de consciência e inspiração, ou ainda, numa imersão de um ou dois meses, e não que havia sido um processo lento, cheio de idas e vindas, planejamento e cortes.
Não cheguei a dizer, mas imediatamente lembrei da frase de Clarice Lispector que me acompanha há anos: “Que ninguém se engane, só se consegue a simplicidade através de muito trabalho”.